SE O (CAM)PEÃO DA PAZ O DIZ…

Ciente do seu papel e do peso político que tem, seja no contexto africano ou no mundial, o Presidente angolano, general João Lourenço, manifestou-se em Itália “apreensivo” com o rumo dos conflitos no mundo e voltou a considerar a invasão da Ucrânia como a maior ameaça à paz e segurança na Europa, apelando novamente a um cessar-fogo. Moscovo e Kiev pararam para escutar o “campeão da paz” em África…

O chefe de Estado angolano destacou as “perspectivas animadoras” para o futuro próximo das relações entre Angola e Itália, tendo sido assinados um conjunto de instrumentos jurídicos que reforçam a cooperação bilateral entre os dois países.

Notou, por outro lado, que “só pode haver desenvolvimento económico e social dos países num ambiente de paz e segurança”. E mesmo assim não é garantido Basta ver o estrondoso falhanço económico e social de um país que vive – há mais de20 anos – em paz e em segurança e que se chama… Angola.

“Por esta razão, aproveitamos esta oportunidade para manifestar a nossa grande apreensão com o rumo dos conflitos no mundo, que urge resolver, por ameaçarem as vidas dos povos e das economias de países e regiões do nosso planeta”, exortou o general que lidera uma monumental experiência científica em Angola, com 20 milhões de pessoas (pobres) que todos os dias vão aprendendo a viver sem… comer. Até agora os resultados não são animadores (quando estão quase a saber viver sem comer… morrem), mas João Lourenço não desiste.

O general João Lourenço apontou, nomeadamente, a instabilidade em África, criada pelo terrorismo e os golpes de Estado nos países da região do Sahel, conflitos como o da República Democrática do Congo e do Sudão, bem como o conflito israelo-palestiniano que “não tem contribuído para os esforços da comunidade internacional de fazer do Médio Oriente uma zona de paz e segurança”.

O Presidente do MPLA disse ainda que a situação na península coreana merece atenção pela ameaça nuclear que representa, enquanto a invasão e ocupação de parte do território da Ucrânia pela Rússia, “deve ser condenada e desencorajada”.

“É urgente alcançar-se um cessar-fogo imediato e dar-se início a conversações que tragam uma paz duradoura e a garantia de que esta tragédia jamais voltará a acontecer em solo europeu”, salientou. Só faltou mesmo dizer: “contem comigo para liderar o processo de paz”.

João Lourenço, que conclui hoje a sua visita oficial de dois dias a Itália foi condecorado com a Ordem de Mérito da República Italiana, atribuindo ao Presidente italiano a Ordem Agostinho Neto (o assassino que mandou, em 27 de Maio de 1977, massacrar milhares e milhares de angolanos e que é, segundo o MPLA, o único herói nacional do reino), e lembrou que Itália foi o primeiro país europeu a reconhecer, em Fevereiro de 1976, Angola como um Estado soberano.

“Viemos a Itália com o propósito de aprofundar os laços de amizade e de cooperação já existentes entre os nossos países, reafirmar o desejo de ver cada vez mais investimento privado italiano em Angola e angolano na Itália”, afirmou o chefe do executivo, realçando que “o ambiente de negócios que se vive em Angola é bastante favorável ao investimento privado estrangeiro”.

Seja quem for o Presidente, Itália promete (quase) tudo

Os Presidentes de Angola e Itália concordaram em 6 Fevereiro de 2019 no reforço da cooperação entre os dois países, além do sector petrolífero, em que a italiana ENI tem um papel relevante. Sergio Mattarella aproveitou para convidar o seu homólogo a visitar Itália, um convite a que, é claro, João Lourenço disse que sim.

Após uma reunião conjunta, os dois chefes de Estado destacaram a amizade entre os dois países e salientaram as oportunidades de cooperação que existem.

“Destacamos o papel que a empresa petrolífera ENI vem jogando ao longo dos anos, mas gostaríamos que empresas italianas de outros ramos de economia tivessem em Angola a mesma presença que tem esta empresa italiana do ramo dos petróleos, precisamos de diversificar o investimento italiano em Angola da mesma forma que precisamos também de passar a conhecer uma maior presença dos investidores angolanos na Itália”, disse João Lourenço.

Por seu turno, o Presidente italiano, Sergio Mattarella considerou uma honra ser o primeiro chefe de Estado italiano a visitar Angola, o que traduz um “sinal da grande amizade de longa data que une” os dois países “em todas as circunstâncias, principalmente na situação difícil da independência de Angola”.

O dirigente italiano destacou a cooperação económica com Angola, que podem ser reforçadas em sectores como o agro-alimentar, infra-estruturas, energias e turismo.

“Esta colaboração, amizade, é muito mais reforçada pelos contactos de hoje deste encontro, eu tive a ocasião de manifestar ao Presidente João Lourenço a minha grande apreciação pelo seu papel fundamental em África e em Angola em prol da estabilidade e da intensificação da colaboração com os outros países”, referiu o chefe de Estado italiano

No encontro, segundo Sergio Mattarella, foi abordada a colaboração económica entre os dois Estados, sendo consenso que “há muitos sectores” nos quais se pode trabalhar “de forma frutuosa” para desenvolver também mais amizade e mais cooperação.

“Também registamos a amizade que foi provada hoje pelo acordo de um Memorando de Entendimento, que torna ainda mais intensos os laços de colaboração”, frisou o Presidente italiano, salientando que os dois países têm “muitas razões e muitos âmbitos de colaboração e de amizade”.

Aproveitando o balanço, e como mandas as regras dos bons amigos, Sergio Mattarella convidou o seu homólogo angolano a visitar Itália, um convite que foi aceite por João Lourenço.

João Lourenço destacou os laços de amizade entre os dois países, que datam desde a independência de Angola, em 1975, sendo a Itália o primeiro país da Europa a reconhecer a independência do Estado angolano.

Segundo o Presidente angolano, passou em revista com o seu homólogo o nível das relações de amizade e de cooperação entre os dois países, considerados “bom, mas que pode ser melhor, sobretudo no que diz respeito à cooperação económica”.

No dia 27 de Novembro de 2017, João Lourenço elogiou as históricas relações com a Itália, apontando a necessidade de alargar a cooperação, já existente na área do petróleo e da defesa, a outros sectores económicos.

O chefe de Estado falava no palácio presidencial, em Luanda, em conferência de imprensa conjunta com o primeiro-ministro italiano, Paolo Gentiloni, que se tornou no primeiro chefe de governo de um país ocidental a ser recebido por João Lourenço, após a sua investidura como Presidente da República, em 26 de Setembro.

“Nós pretendemos aprofundar a cooperação económica entre Angola e Itália, em vários domínios, uma vez que de momento conhecemos algum avanço nos domínios energético, por causa dos petróleos, e também da defesa. E pretendemos corrigir essa situação, estender a cooperação a outros sectores importantes da nossa economia”, afirmou João Lourenço.

O Presidente recordou o apoio que organizações não-governamentais italianas prestaram aos então movimentos nacionalistas, durante o período da guerra colonial, e da própria sociedade italiana, que permitiu a Agostinho Neto (MPLA), Amílcar Cabral (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde) e Marcelino dos Santos (FRELIMO) serem recebidos, em audiência, em 1970, pelo papa Paulo VI.

“Em 1975, quando o nosso país se tornou independente, a Itália foi o primeiro país europeu que reconheceu a independência de Angola. E, talvez por isso, não seja por acaso que também é o chefe do Governo italiano que efectua a primeira visita a Angola após a minha investidura”, enfatizou João Lourenço.

Na mesma intervenção, Paolo Gentiloni afirmou que a sua visita a Angola serviu nomeadamente para “confirmar o apoio” do Governo italiano ao novo executivo angolano e ao “programa muito importante” em curso, de reconversão económica do país, ainda essencialmente dependente das exportações de petróleo.

Na altura, o primeiro-ministro Paolo Gentiloni transmitiu a disponibilidade de Itália para alargar a cooperação a outros níveis, tendo assistido à assinatura de acordos de cooperação entre as petrolíferas ENI e Sonangol, ao nível de produção de petróleo e gás, bem como de refinação.

Na área da defesa, a cooperação baseia-se essencialmente na aquisição a Itália de helicópteros e embarcações para as Forças Armadas Angolanas.

E como está a cooperação na agricultura?

Em Julho de 2015 foi divulgado que a Itália ia apoiar a pesquisa e formação agrícola em Angola no âmbito de um memorando de entendimento para desenvolver aquele sector, assinado no dia 22 desse mês, em Luanda, entre os dois governos, com a perspectiva de reforço dos investimentos privados italianos.

A informação foi transmitida aos jornalistas pelo ministro das Políticas Agrícolas, Alimentares e Florestais de Itália, Maurizio Martina, após a assinatura de um acordo que, explicou, representa um “um porto de partida” para o apoio italiano a Angola “nos próximos anos”.

“Vamos trabalhar em conjunto, em particular as nossas empresas, no campo da pesquisa e da formação agrícola. E unindo as nossas forças em novos projectos empresariais”, sublinhou o governante italiano.

Áreas como a mecânica agrícola e das tecnologias da irrigação, acrescentou Maurizio Martina, mereceram igualmente referência nos objectivos do memorando então assinado, que não foi tornado público.

Aquele ministro assumiu ainda que “projectos importantes” previstos para o sector agrícola em Angola “interessam” a grandes grupos empresariais italianos do sector agro-alimentar, os quais “querem investir” no nosso país.

“É do interesse italiano trazer a Angola o verdadeiro produto agro-alimentar de Itália”, assumiu Maurizio Martina, recordando a importância da indústria italiana no plano internacional.

De acordo com o então ministro da Agricultura de Angola, Afonso Pedro Canga, este memorando de entendimento com o Governo de Itália iria permitir “reforçar o apoio” na investigação científica, na formação de quadros, mecanização agrícola, genética ou cooperação empresarial no sector agro-alimentar.

“Há interesse das partes de reforçarmos a intervenção dos nossos empresários, de empresários italianos a investir em Angola e em associação com os seus colegas angolanos”, disse Afonso Pedro Canga, admitindo o desejo angolano de “tirar partido” da alta tecnologia e competitividade da agricultura italiana.

“Podemos aproveitar essa experiência e capacidade para desenvolver a nossa agricultura”, sublinhou o governante.

O ministro garantiu que este memorando de entendimento assinado com o congénere italiano seria para implementar “imediatamente” (2015), para rapidamente incrementar o investimento daquele país em Angola. “Temos todas as condições para começar a trabalhar”, enfatizou.

Os governos de Angola e de Itália tinham assinado na mesma altura, em Roma, três instrumentos de cooperação bilateral, com destaque para o desenvolvimento da agricultura, durante a visita oficial do Presidente José Eduardo dos Santos.

Foto: Sergio Mattarella com João Lourenço (Fevereiro de 2019) e com José Eduardo dos Santos (Março de 2016)

Folha 8 com Lusa

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